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Mostrando postagens de fevereiro, 2014

Não se pode parar o trem da história por muito tempo

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Ser historiador não é muito gratificante no Brasil. Aqueles que não têm a história como um simples hobby e se arriscam na profissão, seja por utopia, seja por amor, acabam tendo como única saída a sala de aula — com os salários aviltantes e condições de trabalho frustrantes que todos conhecemos. Mas, ao menos, em termos pessoais, lidar com essa apaixonante disciplina nos faz ter uma perspectiva da realidade muito mais profunda do que a média geral da população – que, por sinal, é cada vez menos estimulada a dominar a sua própria história, e muito menos entender como ela funciona e pra que serve. Quem lida com os fatos do passado pode chegar até a fazer projeções para os anos vindouros — não por acaso cada vez mais historiadores andam sendo chamados para explicar conflitos pelo mundo, como a crise da Venezuela ou o golpe na Ucrânia, usando o passado para tentar predizer para onde vai o futuro, com grande chance de acerto. O que me traz a uma questão brasileira do presente. Nossa to

SIP: onde se forma o consenso da imprensa conservadora latino-americana

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Aqueles leitores mais distraídos, que podem achar que as grandes mídias da América Latina têm sempre aquela visão idêntica sobre política, economia, etc. por pura obra fortuita do acaso – por exemplo, sempre a favor do mercado, a favor da “liberdade de expressão”, contra a regulação da comunicação ( Lei de Médios ) e contra qualquer governo ou político governante de esquerda – talvez nem sequer desconfiem que esse consenso é na verdade fabricado num clube de empresários donos de jornais chamado Sociedade Interamericana de Prensa (SIP). Todos os grandes jornais brasileiros, como a Folha de São Paulo , O Estadão e O Globo, além de grupos como Diários Associados e Abril são filiados ao grupo com sede em Miami – por acaso local de exílio dos cubanos opositores de Fidel Castro – e que fomentam na América Latina a visão conservadora do patronato de imprensa local associado com grandes empresas capitalistas das Américas e do Departamento de Estado dos EUA . Fundada em 1943, a SIP vem p

Projeto de Lei em tramitação poderia ter salvo a vida de cinegrafista

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O cinegrafista Santiago Andrade da Band poderia estar vivo hoje, se os congressistas brasileiros já tivessem votado e aprovado o projeto de lei 3271, de autoria do deputado federal José Stédile (PSB/RS) que visa alterar a redação de dispositivos do Decreto-Lei nº 4.238, de 8 de abril de 1942, que dispõe sobre a fabricação, o comércio e o uso de artigos pirotécnicos, como a bomba que matou o cinegrafista recentemente.  O projeto atualmente aguarda parecer para apreciação no plenário da Câmara. Poder de destruição letal De acordo com dados do site do deputado , por ano 5 mil pessoas são vítimas dos fogos, sofrendo mutilações graves e outras que chegam a morrer com o manuseio dos artefatos. Se não bastasse isso, também é importante ressaltar o impacto nos animais que morrem de infarto, enforcamento ou se perdem nas ruas por conta do barulho e do estresse. Pessoas com problemas de saúde e crianças pequenas também são vítimas do incômodo provocado por este tipo de diversão estúpida e per

Sem liderança, os protestos no Brasil não têm futuro

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Aos poucos, vou perdendo a convicção nos protestos que andam acontecendo e os que estão para acontecer. Não porque não concorde com essa legítima forma de manifestação amparada até pelas constituições liberais burguesas, mas porque a acefalia dos movimentos sociais no Brasil, fragmentados, desunidos, sem uma linha de conduta, sem direção, tornam os protestos presas fáceis daqueles a quem pretendem combater – esses sim, bastante organizados e com objetivos muito bem definidos. Parece que, até agora, a maior bandeira dos protestos tem sido o lema “ Não vai ter Copa ”. E por que não vai ter? Porque “ falta saúde, educação e transportes ”. Sim, isso está muito claro. Mas qual a estratégia para atingir esses objetivos? Que tipo de organização política permitirá alcançar o poder? De que maneira? Aí que a coisa começa a complicar. Existia uma frase irônica – porém, sintomática -- que se dizia muito na época do Estado Novo no Brasil: “ A esquerda só fica unida na prisão ”. Sempre existiu um

Água engarrafada, a última jogada da publicidade

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Houve um tempo que a American Tobacco Corporation , nos Estados Unidos, queria aumentar as vendas de cigarro no país, e então contratou o papa da publicidade na época, Edward Bernays , que aplicou na propaganda conhecimentos de psicologia adquiridos com seu tio famoso, Sigmund Freud. O alvo era o público feminino , pois até aquele momento, o cigarro era um hábito tipicamente masculino. Bernays conseguiu convencer as mulheres através da publicidade, de que fumar era desafiar o poder masculino, era chique, dava status , e assim conseguiu convencer as mulheres a fumar, dobrando os lucros da indústria do tabaco. Estava inaugurada a era moderna da publicidade . Hoje a propaganda continua uma das armas mais importantes do sistema capitalista, induzindo-nos a consumir produtos que de outra forma não teríamos a menor necessidade. Dessa vez, o alvo é a água engarrafada .  A privatização da água é um sonho antigo, talvez a última fronteira do capitalismo mundial. O presidente do grupo Nestlé,

Eduardo Coutinho e a questão agrária no país

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Neste 2014 completam-se 30 anos do lançamento do filme-documentário Cabra marcado para morrer , do cineasta e documentarista Eduardo Coutinho , que acaba de ser tragicamente assassinado em seu apartamento no último dia 2, aos 80 anos de idade, em circunstâncias ainda não totalmente esclarecidas. No início dos anos 60 a realidade degradante do mundo rural brasileiro passou a chamar maior atenção da sociedade de um modo geral. Envolvido em atividades do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (UNE) o então jovem cineasta Eduardo Coutinho participou de um projeto itinerante da UNE para registrar e divulgar a cultura popular dos rincões brasileiros. De passagem por Sapé, na Paraíba, onde se realizava um protesto pela morte de João Pedro Teixeira, Coutinho conheceu a viúva do líder camponês morto em 1962, Elizabete Teixeira , e resolveu realizar o filme documentário para contar a sua história. Interrompido pelo Golpe de 64 e retomado 17 anos depois nos anos 80, na re

Moralistas muitas vezes lutam contra si mesmos

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Nessa última sexta-feira parece que o país parou mais uma vez para assistir ao último capítulo de uma novela. E não foi só porque o brasileiro adora esse tipo de entretenimento, pois afinal, dizem, a novela em questão não foi das mais empolgantes, e sim por conta da expectativa de um tão polêmico beijo gay , que acabou, de fato, acontecendo. Durante anos se debateu as possíveis consequências para a “ família ” brasileira se um ato tão banal fosse transmitido em rede nacional, o que mostra o quanto ainda estamos atrasados, presos em valores absolutamente ultrapassados neste país (embora o próprio beijo enfim transmitido mostre que estamos melhorando aos poucos). Isso se dá muito por conta da persistente influência de costumes tradicionais, conservadores, cristãos, que durante muito tempo prevaleceram no Brasil e que recrudesceram nestes novos tempos de transição de comportamentos. Seria uma forma de controlar as supostas “promiscuidades” alheias e zelar pelos valores de deus, da pátri

Um Rio de farofeiros

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Vejam vocês como a vida dá voltas… Houve um tempo em que os moradores da Baixada e da Zona Oeste do Rio de Janeiro, regiões onde vive a parcela economicamente mais pobre do Grande Rio, sempre que iam curtir o lazer nas praias da Zona Sul, eram ironizados e tachados pejorativamente como “ farofeiros ” pelos moradores da alta classe média da área rica da cidade: por considerarem os preços praticados nos bares e nos vendedores ambulantes abusivos ou acima de suas capacidades, eles geralmente traziam as suas comidas e bebidas de casa, em isopores , para economizar. Muito bem. Mas eis que o Rio de Janeiro, de uma hora pra outra, resolveu se tornar uma das cidades mais caras do planeta, especialmente nos setores de transporte, turismo e alimentação, com estabelecimentos comerciais praticando preços simplesmente surreais, principalmente nas regiões que receberão o maior número de turistas para a Copa do Mundo deste ano. Quando a onda da ganância e oportunismo atingiu o preço das cervejas no

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