O QUE PRECISAMOS SABER SOBRE Redução da maioridade penal

Atualizado em 3 de maio de 2015

Tem crescido nas redes sociais campanhas para a redução da maioridade penal de 18 para 16 e até para 14 anos, sempre na carona de alguma comoção recente que tenha ocorrido por conta de algum crime envolvendo a participação de menores. Mas seria esta realmente a solução para os nossos problemas de violência urbana? O que sabemos de fato sobre esse tema? Talvez um pouco mais de reflexão sobre o assunto seja necessário antes de uma opinião tão contundente.

O Estatuto da Criança e Adolescente permite a impunidade? NÃO

Muita gente diz que o jovem pratica o crime sabendo que não vai para a cadeia por causa da suposta benevolência do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Puro equívoco. Primeiro, é sabido por todos os médicos e pedagogos que o jovem age no crime por puro impulso, oportunidade e por falta de perspectiva. Quem disser que um menor de idade se sente acolhido pelo ECA para praticar crimes, dá a entender que o jovem leu o Estatuto ou descobriu que poderia fazer qualquer coisa impunemente, o que é um grande absurdo. Segundo, o ECA só é lembrado convenientemente quando um adolescente comete um crime, mas nunca quando ele é vítima de maus tratos, violência sexual ou abandono. Dois pesos, duas medidas?

De acordo com o advogado Ariel de Castro Alves, coordenador do Movimento Nacional de Direitos Humanos,


Nos últimos meses, pesquisas divulgadas por algumas instituições reforçaram o entendimento de que as principais vítimas da violência alarmante que toma conta do Brasil são crianças, adolescentes e jovens. Um recente trabalho coordenado pelo Núcleo de Estudos da Violência da USP (Universidade de São Paulo) analisou mortes de jovens entre 1980 e 2002, concluindo que os homicídios contra crianças e adolescentes representaram nesse período 16 % do total de casos ocorridos no País; 59, 8% dos crimes foram praticados com armas de fogo. O último estudo do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), divulgado no final do ano passado, afirmou que 16 crianças e adolescentes são assassinados por dia no Brasil. Entre 1990 e 2002, essas mortes aumentaram 80%.

Desconfie de qualquer coisa que contenha a máxima “Acorda Brasil!”

Depois vêm aquelas frases de efeito na internet – porém totalmente falsas – que dizem “no Brasil, menor pode roubar, pode matar, pode estuprar, etc.”. Pode mesmo?

Redução da maioridade penal

Essas pessoas que repetem os clichês mais idiotas que veem e ouvem precisam saber que, no Brasil, a vida de grande parte desses jovens está muito longe de ser uma maravilha. Ao contrário do que diz o cartaz acima, que circula pela internet, milhões de crianças e adolescentes trabalham muito e no serviço pesado desde cedo, quando não deviam. Quando chegam perto dos 18 anos, por não terem sido educados no tempo devido, não conseguem emprego. Muitos não levam “palmadinhas” mas são surrados por suas famílias, espancados, mortos de tanto apanhar. E dos 12 aos 17 anos, não podem ser presos, mas respondem por seus crimes de diversas maneiras, com penas em estabelecimentos socioeducativos ou medidas corretivas diversas. Não poderia ser mais enganosa a propaganda acima.

Como a prisão pode ser a melhor solução?

É claro que não podem cometer crimes, nem eles, nem ninguém. Agora eu me pergunto: o que se ganha tirando um menor de idade infrator de um estabelecimento corretivo para jogá-lo dentro de uma penitenciária, sujeito a todo tipo de perigo e má influência, verdadeiras escolas do crime como as que conhecemos? Isso resolveria o quê? Nada. Mas continua sendo vendida como solução da criminalidade para uma classe média estúpida e medrosa.

Cada menor carente preso é um concorrente a menos para os filhos da classe média

De cada 100 crimes no Brasil, apenas 1 é praticado por menor de idade. Seria inteligente nos concentrar neste 1 por cento para solucionar a criminalidade? Muito mais importante e produtivo do que sugerir o aumento da punição, é atacar o verdadeiro problema da violência brasileira: a brutal desigualdade social e econômica que joga milhares de jovens na criminalidade todos os dias por pura falta de perspectiva, especialmente nas grandes cidades brasileiras. Mas isso a sociedade não quer discutir, pois interfere muitas vezes na condição social privilegiada da qual as classes médias desfrutam, tendo medo de perdê-la com uma melhor distribuição de renda e educação de qualidade para todos, o que refletiria na competição pelos melhores postos de trabalho.

Enquanto as pessoas não atentarem para este fato crucial, se distraindo com superficialidades como a diminuição da maioridade penal em vez de exigir políticas públicas para diminuir o fosso social entre ricos e pobres, nada será realmente resolvido.





Comentários

  1. Os menores não leram o ECA mas sabem da sua impunidade pela observação, observam os amiguinhos menores saindo impunes e se informam, muitos sabem até o artigo que estão ferindo, :"-sou 157 doutor."

    Mesmo que não reduza a violência, estará se fazendo justiça, responsabilizando uma pessoa que sabe o que está fazendo de maneira que se deve responsabilizar uma pessoa que sabe o que está fazendo.
    3 anos pra latrocínio é uma pena ridícula, injusta, e bizarra.

    Pra crimes hediondos a maioridade deveria ser 12 anos. Pra crimes comuns 16.

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