Amazônia, Forças Armadas e youtubers "nacionalistas"

 

Operações como esta sofrem com falta de recursos do governo federal

O desaparecimento do jornalista inglês Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira, na semana passada, escancarou o abandono do governo no seu papel de fiscalizar ilegalidades que ocorrem frequentemente na Amazônia. 

Ambos os ativistas estão desaparecidos numa região conhecida como uma das mais perigosas da selva, rota de entrada e saída de drogas e de garimpo ilegal em terras indígenas. Bruno Pereira é funcionário do Ibama e pediu licença do cargo depois de ser afastado, ao denunciar a invasão de terras indígenas por parte de garimpeiros ilegais. 

As reportagens sobre o assunto têm demonstrado o resultado do desinvestimento na fiscalização por parte do governo federal, o que levou ao aumento dos crimes e devastação da floresta, dando pretextos para que entidades internacionais voltem a colocar em xeque a gestão da floresta por parte do Brasil. 

A soberania brasileira sobre a Amazônia é uma questão basilar para as Forças Armadas brasileiras, pelo menos em tese. Entretanto, o foco da preocupação dos militares, estranhamente, se dá na demarcação de terras indígenas, que poderia, segundo eles, ser motivo de futura reivindicação separatista por parte dos povos originários. 

Preocupação até cabível diante da intervenção de ONGs estrangeiras na floresta, no intuito de catequizar os indígenas, "civilizá-los" através da adesão à fé cristã. 

Entretanto, este problema envolve muito mais evangelizadores brasileiros do que estrangeiros. Neste momento as igrejas evangélicas do nosso país estão na Amazônia tentando a conversão de indígenas para a sua fé. Não existe, até onde eu sei, comentário das FF.AA. sobre este ato de neocolonialismo cristão sobre os indígenas. 

Também temos "nacionalistas youtubers" na internet que levantam a bandeira do perigo amazônico, destacando a intenção de alguns líderes políticos internacionais de que a Amazônia, dada a sua suposta relevância para a questão ambiental, seja declarada área de gestão internacional. 

A preocupação desses youtubers, mais uma vez, pode ser considerada legítima, embora eles tentem tirar o foco dos prejuízos e pretextos produzidos pelo próprio descaso do atual governo com nossa floresta cobiçada. 

Recentemente tive um debate no Twitter com um desses chamados "youtubers nacionalistas", ativistas de viés conservador, embora não gostem de assumir lado ideológico para não perderem a outra metade de seus inscritos. 

Felipe Quintas publicou um Twitter semanas atrás muito indignado com a crítica de Macron, presidente da França, à gestão de Bolsonaro no que tange a Amazônia. Quando o interpelei de que não adiantava se indignar com a cobiça estrangeira sobre a Amazônia, sem pôr em relevo a atuação desastrosa do presidente brasileiro, que já até sussurrou no ouvido de Al Gore nos Estados Unidos que gostaria de "explorar a Amazônia" junto com o país imperialista, sua resposta foi uma bela passada de pano. Disse que era mais fácil terminar um acordo de exploração da Amazônia do que a "invasão" de um exército estrangeiro. 

Depois de lembrá-lo, a título de exemplo, de que é natural que a British Petroleum cobice nosso petróleo, mas que deveríamos cobrar do nosso próprio país a defesa do nosso precioso recurso natural em vez de focar em quem o deseja explorar, muitas vezes sem nem precisar de guerras nem invasões, o youtuber partiu para o ataque pessoal. 

Estranha postura. Tanto Felipe Quintas, como outros que eu assisto e que não gostam de deixar claro o viés conservador de seus nacionalismos, como Rogério Anitablian* e o "comandante" Farinazzo, defendem a Amazônia, veem com grande perigo a demarcação de terras indígenas, mas ignoram, e por vezes até defendem que tais regiões protegidas sejam exploradas por garimpeiros e invadidas pelo agronegócio, para gerar "riqueza nacional". Um tremendo contrassenso. 

Se a Amazônia corre algum perigo, este é gerado pelo próprio governo federal. Nosso presidente, em mais uma fala que denota sua boçalidade, classificou o trabalho de denúncia e proteção dos indígenas da região conflagrada, feito pelos ativistas desaparecidos, como uma "aventura". Nossas Forças Armadas hesitaram em começar as buscas, só o fazendo depois de grande pressão internacional. O Ibama sofre processo de sucateamento, seus servidores são punidos por denunciar crimes, e nossos militares se preocupam mais com um suposto separatismo indígena do que com a devastação e com a catequização dos mesmos pelas igrejas evangélicas nacionais. 

Enquanto isso, os nacionalistas do youtube berram contra uma fala ou uma atitude que vem de fora. Cuidado com eles. São bolsonaristas, são de direita, são conservadores que posam de isentões na internet para enganar muitos que se consideram de esquerda, pregar o programa de grandes grileiros de terras e garimpeiros ilegais, conscientemente ou não. 

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*atualização: desde a eleição de Lula, este youtuber tem demonstrado um viés menos conservador, tento inclusive, se afastado destes demais militantes youtubers






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