O caso IG Farben: genocídio judeu em nome do lucro na II Guerra

Fábrica da IG Farben, na Polônia

Até que ponto devemos compreender empresas privadas que cooperaram com o massacre de milhões de seres humanos na Alemanha nazista? Terão sido também vítimas do sistema, sem escolha, a não ser fazer parte da máquina de matança do Terceiro Reich? Ou foram oportunistas imorais? E seus funcionários? Culpados ou inocentes? Aqueles que cumpriram a pena imposta pelo Tribunal de Nuremberg depois da Guerra, limparam seus nomes perante a sociedade ou carregarão para sempre a marca da infâmia? Todas estas perguntas são difíceis de responder. Algumas empresas alemãs precisam conviver com estes dilemas em sua história.

As indústrias químicas alemães no final da Segunda Guerra já haviam chegado a níveis abissais de desumanidade. Dentre elas, a IG Farben, um conglomerado de empresas alemães que na época era a quarta maior empresa do mundo. Durante a Segunda Guerra, ela passou a produzir borracha sintética para atender a demanda do exército nazista – e para isso, não se furtou a usar trabalho escravo dos prisioneiros dos campos de concentração.

IG Farben factory in Monowitz 1941 Fábrica da IG Farben, 1941

A instalação da fábrica na região onde também foi assentado um dos maiores campos de  concentração nazistas, em Auschwitz, na Polônia, foi fruto de um golpe de sorte. Heinrich Himmler, comandante da SS, queria fundar uma colônia alemã na Polônia para aproveitar a grande oferta de mão-de-obra de prisioneiros, enquanto o Dr. Otto Ambros, um executivo encarregado da borracha na IG Farben, sem saber, apontou no mapa o mesmo local como o ideal para a nova fábrica, por ficar perto de rios e ter uma ótima conexão ferroviária. A partir de então Ambros e Himmler juntaram interesses numa relação simbiótica: Auschwitz forneceria mão-de-obra escrava para a fábrica, e a IG Farben entraria com dinheiro e material de construção para a colônia alemã.

O relato de maus tratos, condições bárbaras de vida e assassinatos são de arrepiar. Ao tomarmos conhecimento do testemunho de um operário chamado Rodolf Vrba, transportado para Auschwitz em junho de 1942, podemos ter uma ideia:

Os homens corriam e caíam, eram chutados e fuzilados, Kapos de olhos insanos abriam um ensanguentado caminho por entre prisioneiros retardatários, enquanto homens da SS atiravam sem mirar (...) Homens calados, em roupas impecáveis, passavam no meio de cadáveres que não queriam ver, medindo madeiras com vistosas escalas amarelas, tomando precisas notinhas em cadernetas de couro negro, indiferentes ao banho de sangue.

Com o fim da Guerra, 24 membros do Conselho da IG Farben foram denunciados pelos Estados Unidos e levados a julgamento em agosto de 1947, no Tribunal de Nuremberg. Foram acusados de saque e espoliação, escravidão e assassinatos em massa. Dos 300 mil trabalhadores escravos da fábrica, mais de 30 mil morreram. As sentenças, no entanto, foram leves para os condenados. Oito anos de prisão foi a pena mais severa (caso de Otto Ambros) e um ano e meio a mais comum.

 

nurembergTribunal de  Nuremberg

O general americano Eisenhower estava determinado a desmantelar a IG Farben após a guerra, pois era um símbolo da corrupção e da desumanidade do regime nazista. O Conselho de Controle Aliado ficou responsável por esse processo, mas  não fez nada até ser substituído pela Alta Comissão Aliada Ocidental, em 1949. A partir daí, o processo de desmembramento da IG Farben foi completamente frustrado por interesses econômicos. A IG Farben sobreviveu e se consolidou em três das suas antigas companhias: a Bayer, a BASF e a Hoechst. Pra piorar, em 1955, Friedrich Jaehne, sentenciado a um ano e meio em Nuremberg, foi eleito presidente da Hoechst. No ano seguinte, Fritz ter Meer condenado por saque e escravidão, foi eleito presidente do Conselho Supervisor da Bayer.

A fábrica Buna, em Auschwitz, sobreviveu à Guerra e está em plena operação até hoje.

Fonte:

CORNWELL, John. Os Cientistas de Hitler. Ciência, Guerra e o Pacto com o Demônio. Ed. Imago. Rio de Janeiro: 2003





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