Mercado livre só pros outros: por que o Brescia conseguiu levar Batotelli

Mesmo com menor poder financeiro, Brescia vence disputa com Flamengo e leva Mario Balotelli


Recentemente, o Clube de Regatas do Flamengo chamou a atenção do mercado internacional de negociação de jogadores pela sua grande capacidade de investimento. Depois de fazer algumas grandes contratações no mercado interno, como do uruguaio De Arrascaeta e do zagueiro Rodrigo Caio, pagou alguns milhões de euros para repatriar jovens jogadores como Vitinho e Gerson direto da Europa.

Mas a capacidade de contratar do rubro-negro foi ainda mais longe, a ponto de negociar recentemente a vinda da estrela do futebol internacional Mario Balotelli. No entanto, apesar de ter a melhor oferta do rubro-negro carioca, o jogador decidiu ir jogar no modesto Brescia da Itália, ganhando apenas 30 por cento do que ganharia no clube carioca.




A princípio, questões pessoais foram dadas como justificativa pela escolha do jogador, como por exemplo, voltar à cidade onde cresceu, o que seria compreensível. Mas, recentemente, a verdade veio à tona, de acordo com a publicação de um jornal italiano. Graças ao desconto de impostos previsto pela nova lei italiana sobre a chamada "fuga de cérebros", Massimo Cellino, empresário e dono do Brescia, economizará muito dinheiro em descontos de impostos para o governo italiano.

Em 29 de junho a lei foi aprovada na Itália. É assim que funciona: de agora em diante, para jogadores estrangeiros ou para quem volta do exterior depois de pelo menos dois anos, apenas 50% do lucro tributável é tributado. Simplificando: metade dos ganhos dos jogadores não está mais sujeita a tributação.

Saiba mais: 
Como o livre mercado prejudica países em desenvolvimento: o caso do futebol 

Uma enorme poupança que permite aos clubes italianos oferecer salários líquidos mais altos, como foi o caso da Espanha com a lei de Beckham. Uma grande assistência para as equipes da Série A. A Juventus se beneficiou, por exemplo, no caso De Ligt. Sem o desconto do imposto, o Brescia nunca poderia ter garantido a Balotelli 3 milhões de euros líquidos para a primeira temporada e 4,5 para os outros dois.

O acordo é de um ano com renovação automática. Porém, para acessar a facilitação, o jogador deve permanecer na Itália por pelo menos dois anos. E como a regra entrará em vigor em 1º de janeiro de 2020, Mario deve jogar pelo menos três temporadas de futebol. Se sair antes, o valor economizado deve ser devolvido às autoridades fiscais italianas. Resumindo: você terá que, por um tempo, permanecer no clube. O que no caso de Balotelli, não deixa de ser uma grande dúvida.




O que temos então aqui é a interferência de uma lei estatal sobre os pressupostos da livre concorrência do mercado. O Flamengo, por seus próprios esforços e mérito, depois de 6 anos colocando as finanças em ordem, foi capaz de propor um contrato a nível europeu a Balotelli, coisa que ele não teria igual, a não ser com a mãozinha do governo italiano, que teve em vista proteger o mercado do futebol naquele país e dar capacidade de investimento a clubes que, de outra maneira, não teriam essa capacidade.

O que europeus e americanos, ou dito de outra maneira, os principais países capitalistas defendem, na verdade, é o mercado livre para os outros. Para si, não se furtam a lançar mão de leis e determinações especiais de protecionismo, ferindo os preceitos do livre mercado. Não só no futebol, haja vista os fazendeiros franceses estarem com medo do acordo UE-Mercosul porque vai abrir o mercado europeu para os competitivos produtos agrários brasileiros. Vão perder os subsídios do governo.

Está na hora dos clubes brasileiros demandarem condições iguais de competição no mercado, seja exigindo que a FIFA tome providências contra interferências externas nas livres negociações econômicas, ou que o governo do Brasil crie também facilidades fiscais para aumentar o poder de investimento dos clubes nacionais, uma espécie de Lei de Beckham nacional.

O mercado livre, se tem que existir, que seja para todos. Ou então que sejamos capazes de proteger nossa maior matéria-prima, os jogadores brasileiros, para que, em vez de brilharem nas ligas europeias, possam cada vez mais reforçar os times brasileiros.






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