Os povos da América Latina mostram de novo: só os golpes da direita refreiam o seu destino

 

Ex-presidentes progressistas da América do Sul

Os povos da América Latina reagem aos golpes que tentam frear mais uma vez a natural propensão da região a políticas de esquerda.

A vitória de Lucho Arce na Bolívia é apenas o exemplo mais recente de que, respeitadas as regras eleitorais e jurídicas criadas pela própria democracia burguesa, o povo da América Latina, de modo geral, quer as políticas de esquerda no poder, e isso não é de hoje. E quando estas mesmas regras não são respeitadas, o povo vai às ruas exigir seus direitos violados, como no Chile.

Desde a segunda metade do século XX essa tendência, no entanto, quanto mais crescia, mais era refreada pela oposição conservadora capitalista dos diversos países da região, com o apoio, já mais do que documentado, dos Estados Unidos, que se utilizam de várias estratégias criminosas e dos aparelhos à sua disposição para impedir tal movimento à esquerda.

Se, no século XX, durante o advento da Guerra Fria, as frações locais cooptadas para atender aos interesses da burguesia foram, em grande parte, as Forças Armadas, o empresariado, as grandes mídias e setores da Igreja Católica, neste século XXI os empresários e a grande mídia ganharam a companhia dos setores da Justiça e dos neopentecostais.

Seria cansativo enumerar aqui todos os conhecidos episódios de golpes destes dois tipos na região, especialmente na América do Sul. Mas, temos dois exemplos de que o povo destas terras não aguentam os golpistas durante muito tempo.

Na Bolívia e no Chile vem os exemplos mais recentes.

Setenta e nove por cento da população chilena enterrou a Constituição da era Pinochet — que foi preservada por um acordo nos anos 80, após o fim da ditadura — , através de um plebiscito neste domingo, indo às ruas para celebrar o feito histórico.

Além disso, também se pronunciaram a favor de uma Convenção Constitucional Exclusiva, sem a participação de nenhum atual congressista. Isso significa que todos os delegados serão eleitos pelo voto popular apenas para esta finalidade. Uma vitória histórica dos campos progressistas no Chile.

Na Bolívia, os golpistas que retiraram Evo Morales e assumiram o poder, causando tumultos violentos no processo em nome de deus no ano passado, esperavam legitimar o ato ilegal através do sufrágio deste ano. Mas o povo boliviano deu uma resposta contundente nas urnas, dando a vitória já no primeiro turno com ampla vantagem a Lucho Arce, ex-ministro da Economia, candidato do Movimento ao Socialismo (MAS) apoiado pelo próprio Evo.

Como podemos interpretar essas persistentes reviravoltas na política da América Latina de forma geral?

No meu modo de entender, o histórico de golpes militares, sempre produzidos pela direita; de cassações e perseguições políticas, sempre produzidos pela direita; campanhas de difamação e destruição de reputações sempre produzidos pela direita, e por fim, assassinatos de políticos produzidos pela direita, tudo isso com o apoio de órgãos dos Estados Unidos, como já fartamente comprovados por documentação, só tem por único objetivo impedir que se faça a obstinada vontade popular pela justiça social.

Respeitadas as regras da lei, os países da região elegeram só neste século XXI, governos progressistas no Uruguai, Bolívia, Argentina, Brasil, Paraguai, Venezuela e Equador. Destes, somente Pepe Mujica no Uruguai não sofreu nenhum tipo de perseguição durante ou após seu governo.

Só na América do Sul neste começo de século, Christina Kirchner sofreu seis processos sem base por lavagem de dinheiro na Argentina; na Bolívia Evo renunciou após falsas denúncias de fraude para conter a violência da extrema-direita; no Brasil, golpe parlamentar em Dilma e lawfare em Lula; o mesmo processo que ocorreu com Fernando Lugo no Paraguai, deposto "pela lei" sumariamente em menos de 24 horas; na Venezuela, tentativas seguidas de golpe contam com a resistência de Maduro, assim como foi com Hugo Chávez; e por fim, traições e perseguições após o seu governo fizeram Rafael Correa se exilar do Equador, onde foi para escapar da ameaça de prisão.

Com exceção da Venezuela, onde o histórico golpismo ainda guarda semelhanças com os métodos do passado, quando o imperialismo associado com a burguesia local não se furtava ao uso da violência, todos os outros países sofrem com um novo tipo de golpismo onde o protagonismo se encontra no judiciário.

Uma característica em comum a todos esses casos foi a total ausência de respaldo popular. Todos os golpes foram dados pelo alto, sem o apoio das massas, com a coligação de entidades elitistas.

Não é possível acreditar que esta onda seja pura coincidência.

Como não é coincidência a atual tendência de conserto que os eleitores pretendem dar aos golpes, elegendo mais uma vez candidatos progressistas ou, como no caso do Chile, lutando com sucesso para retirar um entulho jurídico autoritário das suas vidas através da pressão de protestos nas ruas.

Todos os golpes e falsas acusações que ocorrem na América Latina não passam de reacionarismo, um ato autoritário das elites para impedir a natural ambição da região por reescrever a sua história.

O que os golpistas precisam entender é que, se continuarem burlando as regras da democracia toda vez que seus interesses são contrariados pelo voto popular, talvez um dia o povo se canse de tentar mudanças pela via eleitoral... 





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