Garantir a “lei e a ordem”, papel das Forças Armadas?

Forças Armadas nas ruas

Nesse mês de setembro, a presidente Dilma Rousseff assinou um documento que estende a permanência do Exército no Complexo da Maré até o final do ano. Faz parte de uma visão equivocada e militarista de resolver os problemas de segurança pública com uma instituição preparada para a guerra. O resultado nós vimos ontem, num confronto armado violento que parou a região e deixou moradores e passageiros em pânico. Mas essa prerrogativa de polícia das Forças Armadas, embora equivocada, é histórica no nosso país, garantida pela própria Constituição de 88, através de uma disputa política que envolveu diretamente os oficiais do Exército.

Militares saem do poder mas não deixam o poder

Durante as discussões preliminares sobre as cláusulas da Constituição de 88, as Forças Armadas iam perdendo seu poder de garantidoras da lei e da ordem. Talvez os constituintes estivessem querendo já adequar nossa incipiente democracia aos exemplos de modelos mais desenvolvidos do mundo, onde esse papel cabe primordialmente às polícias – muitas delas já devidamente desmilitarizadas – e onde as Forças Armadas são uma força de reserva das polícias, e não o contrário, como acontece no Brasil. Isso irritou tanto o general Leônidas Pires Gonçalves, então ministro do Exército, que ele ameaçou encerrar na marra os trabalhos da constituinte. Esse sempre foi um privilégio das Forças Armadas e ele queria que continuasse sendo.

  Leia mais: GLO: na falta de uma guerra, as Forças Armadas se tornam polícia

Apesar de a Ditadura estar oficialmente encerrada havia três anos naquela ocasião, o poder claramente ainda não havia trocado de mãos: estava com os militares. A pressão do general surtiu efeito, e o papel garantidor da lei e da ordem permaneceu com as Forças Armadas no Artigo 142.

  Leia também: A persistente presença autoritária na democracia tutelada brasileira

 

Quem decide quando a ordem está ameaçada?

Como as Forças Armadas podem, ao mesmo tempo, garantir a lei e a ordem e se submeter a elas? Para o filósofo italiano Giorgio Agamben, “o soberano, tendo o poder legal de suspender a lei, coloca-se legalmente fora da lei”. É o típico caso das nossas Forças Armadas. São os militares que decidem quem viola e quando se viola a ordem e a legalidade, não importando a opinião do presidente ou do Congresso, colocando-se claramente acima (e fora do alcance) da lei. Segundo Jorge Zaverucha 1,

Em uma democracia, o poder não é deferido a quem tem força, mas, ao contrário, a força é colocada a serviço do poder. No Brasil, estabeleceu-se uma Constituição e foi entregue, precisamente, aos que são mais tentados a violá-la, a tarefa de manter sua supremacia.

O que é “ordem”

O conceito de ordem não é neutro, nem universal. Definições estão sempre permeadas de interesses de classe e baseadas em determinadas ideologias dominantes. Na mesma linha, a definição de desordem está sempre carregada de estereótipos e preconceitos. São geralmente consideradas desordem a conduta indesejada de determinadas camadas sociais que reivindicam mais direitos num sistema cuja ordem é uma das mais desiguais do planeta. O Artigo 142 da Constituição Federal não especifica exatamente quando a ordem é ameaçada, o que se torna um prato cheio para interpretações baseadas no estereótipo do momento. Recentemente vimos como foi criado e disseminado o mito do “vândalo” dos protestos populares para justificar perseguições arbitrárias e autoritárias contra o livre direito à manifestação, como no passado o mito do comunista subversivo serviu para justificar um golpe de Estado. É lamentável que uma Constituição não deixe claro os limites de atuação das Forças Armadas.

O que podemos tomar disso é uma conclusão perturbadora: nessa nossa democracia tutelada, a Constituição mantém o Golpe de Estado perfeitamente constitucional, desde que liderado pelas Forças Armadas por motivos vagos, como “manter a lei e a ordem”. Mas manter pra quem, cara-pálida?

  Veja também: Forças Armadas contra manifestações

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1 ZAVERUCHA, Jorge. FHC, forças armadas e polícia. Ed. Record. Rio de Janeiro: 2005. p.63.





Comentários

  1. Caro escritor,por não conhecer a constituição do nosso pais você acaba escrevendo bobagens, por exemplo, a constituição garante a liberdade de culto de qualquer religião, por se tratar de um pais com liberdade religiosa, com isso um casal do mesmo sexo se beijar dentro de uma igreja Cristão, é afronta ao culto, seria o mesmo que um evangélico ou católico entrasse dentro de um terreiro e começasse a dizer que tudo ali é coisa do diabo, quem faz isso está afrontando a outra religião, com isso é passível de prisão. Antes de vomitar qualquer coisa na internet, procure saber antes dos fatos, você sim é um fundamentalista liberal... Liberalismo acima de tudo.

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  2. Caro Cleyton, tudo bem?
    Talvez você é que esteja comentando sem ter conhecimento pleno dos fatos.
    Se o que você menciona tivesse ocorrido como você disse, você teria razão. No entanto, referido caso ocorreu em praça pública, e não dentro de uma igreja.
    Grande abraço.

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