A Reforma Política e a disputa em torno do governo

cabo de guerra

Em 2015, está configurado no horizonte uma realidade complexa, porém, bastante interessante no que diz respeito às disputas no campo da política nacional: de um lado, os movimentos sociais, a sociedade civil organizada, os partidos de esquerda e as alas progressistas, lutando bravamente para que o governo faça valer as demandas que prometeu abraçar durante a campanha eleitoral; do outro lado desse cabo de guerra, as forças do Congresso Nacional, do empresariado, dos banqueiros, e das alas mais conservadoras da sociedade, tentando puxar esse mesmo governo para o seu lado. E no centro dessa disputa acirrada, está a pauta da Reforma Política.

Entretanto, alguns setores da esquerda, em vez de ajudar a fazer força, tratam com ceticismo a capacidade do governo de abraçar essa causa, especialmente porque a presidente reeleita, Dilma Rousseff, vem dando demonstrações de que pretende atender as demandas do lado direito deste cabo de guerra. Se formos analisar os nomes que escolheu para compor ministérios de grande importância, eles têm até certa razão para se preocupar. Outros chegam a dizer que a própria Reforma Política não é assim tão importante, como no caso do professor Valério Arcary, militante do PSTU, porque, entre outras coisas, não faria parte da demanda central dos trabalhadores.

Em artigo publicado no blog Convergência, (Por que a luta pelo plebiscito pela Constituinte exclusiva para a reforma política é uma tática equivocada?) o professor pergunta se a Reforma Política (RP) deve mesmo ser o centro da tática da esquerda. E responde que não. Segundo ele, as esquerdas deveriam lutar contra o governo que colabora com a burguesia, e a campanha em torno da RP ilude, burla e engana.

A esquerda do PT e os movimentos sociais que se uniram ao MST e à CUT para defender o plebiscito estão tentando pressionar o governo Dilma para dançar uma salsa, mas a direção do PT já decidiu que quer ir ao baile do segundo mandato com Michel Temer para dançar um samba canção de reconciliação com o grande capital.

Isso é um ponto. Mas o professor parece ter total descrença na mobilização popular e na sua capacidade de influência sobre os governantes. Neste momento, é a única arma com que contamos: pressionar o governo Dilma para que deixe de ser traidor do povo e assuma seu papel de liderança dos movimentos sociais. Em muitos países cujo sistema democrático-burguês se assemelha ao nosso, as demandas da população foram atendidas em grande medida com o povo nas ruas, mesmo com a intenção dos governos de irem por uma outra direção. Não dá pra esperar que a Dilma espontaneamente se veja na intenção de dar uma guinada à esquerda, pois isso já sabemos que ela não vai fazer.

O professor também afirma que “o papel dos sindicatos e movimentos populares não deve ser o de ala auxiliar do governo e do PT em suas disputas com o PMDB”. E nisso ele tem total razão. Mas tirando aqueles que Breno Altman classificou como “militontos”, por seu apoio cego e incondicional ao governo, já vemos críticas e cobranças contundentes destes setores para que o governo não traia o programa que o elegeu. E certamente, a Reforma Política está entre as medidas que serão mais exigidas como prioridade.

Discordo completamente do professor Valério Arcary quando ele afirma que a luta pela constituinte para a implementação da RP não é importante, e chegaria a ser até danosa, porque “divide as esquerdas” em um tema secundário e “de interesse das classes médias”. Ele afirma que “para os trabalhadores o que é central é o salário mínimo de 2015, o direito ao trabalho, os 10% do PIB para a educação e a saúde, e um longo etc..”

Parece que o professor ignora que tais demandas são praticamente impossíveis neste Congresso que ele tanto critica. E ao mesmo tempo ignora que não existe solução imediata. Uma constituinte para a Reforma Política é a única esperança a longo prazo para eleger, no futuro, políticos comprometidos com tais demandas, na medida em que dentre algumas de suas consequências está o fim do financiamento empresarial de campanha.

Se Valério Arcary não fosse tão cético com relação a isso, poderia enxergar aí a razão por que muitos dos movimentos sociais ainda não jogaram a toalha e esperam do governo que ele cumpra o que prometeu. Afinal, apesar dos nomes absurdos escolhidos por Dilma para compor os ministérios, de fato, segundo mandato nem sequer começou. Está muito cedo para largar a corda.





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