Desmonte do Estado e democracia burguesa

A redemocratização do nosso país tomou corpo em paralelo com alguns acontecimentos importantes pelo mundo, naquele final de década de 80. Era o momento em que Mikail Gorbachev estava propondo reformas liberalizantes na União Soviética, que culminaram com um golpe que implodiu o chamado comunismo realmente existente. Neste momento, em 1989, nos Estados Unidos, tomava forma uma doutrina que servirá de cartilha para os países do terceiro mundo na nova ordem mundial: o programa neoliberal.

Preparando um presidente específico para isso

Em 1989 houve a nossa primeira eleição direta para presidente depois da redemocratização, e a nossa classe dominante, capacho, amestrada e controlada pelos interesses capitalistas do imperialismo americano, para o qual se prostra de joelhos, teve a missão de fabricar um Collor de Mello, saído das profundezas do nada, para se tornar presidente do Brasil e aplicar esse receituário no país, através, inter alia, do Plano Nacional de Desestatização. Começaria ali o nosso arroubo neoliberal, o mito fantasioso de que somente a economia aberta, o mínimo de intervenção do Estado no mercado e a privatização de estatais (lucrativas) poderiam ajudar o Brasil a alcançar um estágio de desenvolvimento ideal.

Estes sacripantas só pensavam em seus empreendimentos e seus negócios, o restante do país, que fosse tocado com o mínimo apenas para não entrar em um colapso social e estragar a farra financista.

Sai Collor, entra em cena o Príncipe da Privataria

Fernando Collor teria completado e saído do seu governo laureado pelas elites e pelos agentes do imperialismo capitalista se não tivesse abusado da sorte e sido retirado do poder como um cão sarnento. Como Sérgio Cabral Filho, ele roubou, mas roubou demais. Coube então ao "respeitável" intelectual sociólogo Fernando Henrique Cardoso tocar o projeto de desmonte do Estado brasileiro em benefício de uma meia-dúzia de empresários de olho no patrimônio nacional.

O povo brasileiro renega o projeto privatista

Como sempre, o governo FHC começou incensado pela mídia corporativa burguesa, mas, aos poucos, o mito do neoliberalismo racional foi indo por água abaixo, se tornando insustentável. Bastaram três das constantes crises cíclicas do capitalismo internacional para a nossa frágil economia de semiescambo ir para o limbo. Sem infra-estrutura a ponto do Brasil sofrer com casos de apagão e abastecimento, com a inflação saindo do controle e o desemprego batendo recordes mundiais, foi assim que o Brasil chegou em 2002, no fim do segundo mandato de FHC. Esse foi o legado de 8 anos de governo neoliberal, onde o bom humor do mercado financeiro importava mais do que a comida que o trabalhador brasileiro não conseguia por na mesa de sua família. E assim o eleitorado brasileiro disse um rotundo NÃO ao candidato tucano da continuidade, José Serra que, mesmo escondendo de todas as formas o impopular presidente FHC de sua campanha, perdeu para Lula, que conquistou o governo com a segunda maior votação presidencial da história internacional, só ficando atrás de Ronald Reagan na eleição estadunidense de 84.



A partir daí, começa o que hoje já podemos chamar de interregno antineoliberal. Durante cada nova eleição, desde 2002, o PT soube explorar a imensa rejeição nacional ao privatismo tucano, e bastava a mera lembrança do que foi a criminosa venda da Vale do Rio Doce nos debates eleitorais, para que os tucanos despencassem alguns pontos nas pesquisas.

Quando a democracia não atende os interesses populares

Aí está o cerne da questão. Por que, por exemplo, os Estados Unidos carregam como bandeira a "democracia" como justificativa de suas guerras, quando suas alianças com países autoritários, violentos e ditatoriais como a Arábia Saudita provam que a democracia não é um valor absoluto em si para eles?

Isso porque os capitalistas perceberam que o sistema burguês democrático é o mais conveniente. Não se iludam, o capitalismo já floresceu sob impérios e ditaduras. Mas na democracia, o poder econômico permite eleger sempre os candidatos do status quo, contra aqueles que não tem condições de levantar o mesmo financiamento de suas campanhas e não se comprometeriam com o sistema financeiro caso vencessem. A corrupção institucionalizada do sistema permite comprar deputados para suas causas. A desculpa de que a democracia pressupõe necessariamente o rodízio intermitente de mandatários no poder evita, por seu turno, que algum indesejável eleito por um acidente da natureza possa ficar muito tempo no controle do país. E caso ele dê muito trabalho, inventam-se pretextos para sua retirada, seja através de um processo político-jurídico (impeachment), seja através do incentivo a uma rebelião de setores de determinada sociedade (Venezuela e primavera árabe) ou um simples golpe militar à moda antiga.

Não foi somente assim que os privatistas conseguiram tirar o PT e voltar ao poder para tocar adiante seu projeto entreguista?

Pouco se importam se desrespeitaram a vontade do eleitor, se o governo tampão do vice não tem nenhuma legitimidade aos olhos do país, com mais de 80 por cento de rejeição. Seu governo golpista, entregista e lesa-pátria atua como se tivesse o respaldo de milhões de votos nas costas. O Ilegítimo no poder dorme e acorda pensando em duas coisas: o que eu posso vender do patrimônio público e que tipo de direito garantido pelo Estado eu posso desmontar hoje?

Infelizmente nosso país conta com essa estirpe de gente, brasileiros vira-latas sem auto-estima, individualistas a ponto de jogar nosso futuro enquanto nação no lixo, se puderem sair como bons cães amestrados perante os olhos dos imperialistas internacionais. São essas pessoas as primeiras a combater um levante popular legítimo, são as primeiras a colocar a tropa de choque contra o povo. E numa revolução, também são as primeiras a amanhecer penduradas pelas pernas de cabeça pra baixo num poste, símbolo da revolta de um povo cansado de ser vítima desses bandidos no poder.

Quando essa raça gananciosa acaba até com a ilusão popular de eleger um presidente pelo seu votinho na urna, nada mais é garantido nessa falsa democracia. 




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