Acabaram os grandes eventos no Rio. As UPPs já podem acabar também

Há quem ainda acredite nas boas intenções do ex-governador Sérgio Cabral e do secretário de segurança pública, Mariano Beltrame, quando implementaram, em 2008, com o apoio total da mídia e da iniciativa privada —Eike Batista chegou a ajudar financeiramente o projeto com R$ 20 milhões anuais — a primeira de muitas UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) que iriam ser instaladas em algumas regiões da cidade. Na época, as promessas eram de que junto com a força policial, subiriam também serviços públicos e assistência social, num projeto que, dessa maneira, só poderia ser de longo prazo. No entanto, a saída de José Mariano Beltrame da pasta da segurança antes delas completarem uma década é o primeiro indício de que o projeto, tal como sempre acusamos, será inexoravelmente interrompido, não obstante a cidade viva momentos de verdadeiro terror em termos de violência.

UPP para quem?

A primeira UPP foi no morro Dona Marta, em 2008. Serviu de propaganda para que a imprensa jogasse confete todo dia na iniciativa, mostrando o “sucesso” da campanha, sem levar em conta que o Dona Marta não é e nunca foi nem de longe uma área das mais deflagradas pela violência que envolve o tráfico de drogas. De lá pra cá, outras unidades vieram ser implementadas. Primeiro o BOPE vinha fazendo a varredura, “limpando o terreno” para que as UPPs fossem instaladas. Depois — segundo se acreditava —jovens policiais inexperientes e recém-formados dariam conta de sustentar o território contra as incursões dos traficantes, uma estratégia desgastante que não resolveu o tráfico de drogas, que continuou às escâncaras, e ainda colocou os PMs inexperientes na linha de tiro dos bandidos.

 

Mas alguma coisa estava estranha. Conforme foi se instalando as novas UPPs, víamos no mapa que, coincidentemente, elas pareciam ficar não nas áreas mais necessitadas de atenção, e sim naquelas onde os turistas iriam circular mais, por conta da Copa e dos Jogos Olímpicos:

Mapa das UPPs na cidade do Rio

A única exceção no mapa é a UPP do Jardim Batan, que, podemos afirmar, não estava nos planos. Mas foi instalada depois da comoção causada pela captura e tortura de jornalistas que foram fazer uma matéria no local.

Agora compare com as áreas em amarelo no outro mapa abaixo, que mostra os locais de maior circulação de turistas na cidade:

Mapa-de-instalações

Coincidência? Com exceção de Deodoro, que não precisou de UPP porque não tem áreas de conflito, ficando dentro de uma área militar do Exército, todas as outras regiões com grandes eventos, ou seja, com muitos turistas, estavam repletas de UPPs. O que nos leva à seguinte questão: já que não foram feitas para atender aos moradores como se dizia, e sim para garantir a sensação de segurança dos turistas durantes os grandes eventos que se encerraram, é lógico dizer que as UPPs estão também com os dias contados? Parece óbvio que sim.

Em recente entrevista para o site Brasil de Fato, o delegado da polícia civil Orlando Zaccone também acha que sim.

A demissão de Beltrame em meio a uma crise da segurança é simbólica. É um marco do começo do fim do projeto falido das Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs). Estamos voltando a 2008, quando as UPPs foram implementadas e a gente vivia uma crise muito parecida.

Veja mais: “Demissão de secretário de Segurança é o começo do fim das UPPs”, diz delegado

Desde sempre, movimentos sociais e entidades ligadas às favelas denunciavam que as UPPs eram uma mera fachada para iludir o eleitor, que pensa que a solução da criminalidade é mais repressão, mais polícia, mais prisão. Agora estamos prestes a confirmar que o governo do PMDB enganou a população carioca, gastando milhões num projeto que vai acabar e deixar a violência no mesmo ponto em que começou. No mesmo ponto? Talvez pior, pois, teremos a guerra das facções para retomar os espaços que a UPP deixará pra trás. Mas tudo bem, os turistas já foram embora mesmo, estão seguros em suas casas.





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